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    • Altares vazios

    Altares vazios

    • Categorias Crônicas de Pesquisa, Novidades
    • Data 17 de setembro de 2019
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    No caminho de bicicleta pelo centro de Utrecht, entre minha casa e a universidade, uma fachada de um estabelecimento de cabeleireiros me chama a atenção. Sobre o toldo da loja e entre duas janelas está um espaço vazio. Com uma base e uma cobertura de cimento, que lembra de certo modo uma coroa, aquele espaço parece ter sido feito para acolher e expor algo, mas ao invés disso está coberto com pregos pontiagudos para evitar que pombos e corvos o ocupem. Logo abaixo um quadrado, também vazio e em cimento, indica que havia ali uma legenda, um nome, uma explicação para o que estava exposto naquele espaço, agora vazio. Na base das janelas, as cruzes de tijolos em baixo relevo corroboram a ideia.

    Notei esse espaço vazio logo no meu primeiro mês na cidade e, desde então, aquilo me gerou certo incômodo. Dia após dia, ao passar em frente aquele prédio olhava fixamente para o espaço vazio, como que imaginando que milagrosamente, em uma manhã, ele voltaria a expor o que foi feito, oras, para expor: em vez dos pregos uma imagem de um santo católico. Evidentemente isso nunca aconteceu. O espaço poderia ter sido feito para expor uma imagem de São Martinho, o padroeiro da cidade e da sua catedral, mas a grande probabilidade, na minha cabeça, é que fosse mesmo para uma imagem de Nossa Senhora, tanto pela forma de coroa, como pela sua recorrência no sul do país.

    Nos últimos anos tenho feito uma coleção de fotografias de altares públicos de Nossa Senhora, encontrados principalmente em ruas e em estabelecimentos comerciais. além de me tornar um pouco obcecado e com ideia fixa nesse assunto, isso também tornou meu olhar mais aguçado a achar esses altares em todo lugar que eu vá. Só que não na Holanda ou ao menos não nessa região da Holanda. Ao tentar continuar a proposta dessas fotografias, pedalando pela cidade, logo percebi que, com exceção de uma estátua de Santo Antônio na fachada de uma escola católica, só encontraria estátuas de santos em túmulos do cemitério católico. Como era evidente e de se esperar, em um país convertido ao calvinismo há quinhentos anos, é difícil encontrar imagens de santos em espaços públicos. Santos católicos estão apenas entre católicos, o que não era o caso do prédio do salão de beleza. 

    Essa busca, muitas das vezes só pela curiosidade, logo começou a me mostrar que aqueles altares eram mais corriqueiros do que eu supunha. As imagens dos santos se foram, só que alguns de seus suportes permaneceram nas ruas, expondo o nada. Em um primeiro olhar seria simples identificá-los como altares do passado, como parte do patrimônio arquitetônico do país e por isso não sujeitos a demolição. Um lembrete materializado de que o país um dia foi católico. Contudo, arriscando uma outra abordagem, eu questionava o que aqueles espaços vazios diziam sobre como o país é no presente. 

    O calvinismo foi implantado na Holanda justamente através das revoltas iconoclastas, quando multidões de pessoas saíram às ruas e entraram nas igrejas destruindo todas as imagens religiosas, com a justificativa protestante na qual representações do divino seriam ídolos, seriam fetiches, e por isso os ícones deveriam ser eliminados. A prerrogativa calvinista é que não deveria haver mediações entre as pessoas e Deus, fosse qual fosse, e por isso a religião buscava ser construída mental e espiritualmente, renegando ou ao menos buscando renegar as suas formas materializadas.

    Acontece que após as revoltas iconoclastas, e a expulsão dos católicos de suas igrejas, esses mesmos templos passaram a ser usados pelos calvinistas: prédios feitos para os rituais católicos foram adaptados para os rituais protestantes. Assim, se para os primeiros haviam muitos altares aos santos, para os segundos haviam os muitos altares vazios. Vazios, sigo repetindo essa palavra porque ela é aquela que mais sinto presente quando entro em igrejas protestantes: falta uma estátua de santo ali, falta o altar lá, falta uma pintura acolá. Em alguns casos, em catedrais de seiscentos anos, fico com a impressão de que ela foi uma construção inacabada, que teve que parar antes de ser concluída, uma construção em que ficaram faltando diversas coisas. Elas não me parecem lugares sagrados.

    Após meses entrando apenas em igrejas calvinistas e luteranas, em maio de 2019 pude participar de um curso sobre imagens religiosas em Roma. Em pesquisas de campo do curso, e também por iniciativa própria, visitei dezenas de igrejas naquela cidade que é considerada a matriz do catolicismo mundial. Mesmo sendo minha primeira vez na Itália, fiquei fascinado como muitas vezes me sentia em casa. Fosse qual fosse a igreja que entrasse, por mais exuberante que fosse a sua arquitetura, e mesmo com diversas obras primas do renascimento e do barroco, ainda assim me sentia mais familiarizado. Mesmo com as mudanças bruscas de estilo e de ornamentos entre uma e outra, ainda assim conseguia dominar os significados, os símbolos, os rituais: não faltava nada.

    Tudo isso, claro, é uma fruto de uma relação, mais precisamente de um encontro da minha corporeidade com aqueles espaços, como diria Thomas Csordas. Criado em uma família católica no interior de São Paulo, e pesquisando a construção de uma Catedral católica no Brasil, encontrava ali, em Roma, boa parte dos referenciais estéticos e religiosos, para mim, mas também para a história do cristianismo, primordiais, replicados e ressignificados pela colonização católica na América Latina. Já a minha reação em um templo calvinista, na Holanda, não poderia ser outra além de um estranhamento nesse sentido: da falta, da ausência, claro, a partir justamente dos mesmos referenciais.

    Durante uma das visitas de campo às igrejas romanas pude conversar com Jojada Verrips, professor aposentado da Universidade de Amsterdã, que era um dos ministrantes do curso e que também visitava a cidade pela primeira vez. Mesmo não sendo uma pessoa religiosa, mas tendo sido criado em uma família holandesa calvinista, ele me confessou que não conseguia ficar muito tempo dentro daquelas igrejas porque se sentia sufocado. Para ele as igrejas católicas eram o excesso em todas as suas formas: de símbolos, de significados, de imagens, de riqueza, de história, de beleza. Quando ele tentava entender tudo que o cercava, era como se lhe faltasse ar, como se ele fosse bombardeado por informações e sensações que o obrigavam a sair do prédio para conseguir respirar. As igrejas católicas lhe causavam claustrofobia. Ouvindo esse relato, lembrei prontamente de outros dois relatos muito parecidos. 

    O primeiro narrado pelo Ronaldo Almeida, meu orientador e professor da Unicamp. Ao ser socializado religiosamente em templos evangélicos, mesmo não sendo mais religioso, ao entrar em igrejas católicas ele se sentia sem espaço, oprimido, vigiado, principalmente pelos olhares das imagens dos santos. Já as pesquisas de Mattijs van de Port, professor da Universidade de Amsterdã, ressaltam também o excesso das igrejas baianas, do barroco brasileiro, do candomblé, mas diferente dos dois casos narrados, da opressão e da falta de ar, o professor nascido e criado no sul da Holanda ressalta como uma igreja católica de Salvador na verdade lhe causa uma reação muito particular: a ereção dos mamilos e sensação de êxtase. 

    Assim, a partir da experiência de quatro antropólogos em templos religiosos, é interessante notar como a ausência e o excesso são fatores estéticos marcantes nas vivências que diferenciam protestantes e católicos. E como essa relação entre a corporeidade e o espaço religioso é tão profundamente construída, que as sensações permanecem mesmo que as pessoas deixem de praticar as religiões: são as formações estéticas e sensoriais na teorização de Birgit Meyer.

    Voltando ao tema dos altares vazios, foi só recentemente que decidi começar a fotografá-los. Comecei com aquele do cabeleireiro e fui seguindo o mapa mental daqueles que lembrava onde estavam. Ao transformar os altares vazios em imagens, em fotografias, e ao poder compará-los lado a lado, penso que a chave esteja mais na definição do vazio. As fotografias em si podem ser bem tediosas já que o nada é tão difícil de ser capturado quanto o silêncio, já dizia Manoel de Barros. Que eles estão vazios não há dúvida, mas enquanto pela perspectiva católica o vazio é marcado pela falta, por aquilo que precisa ser preenchido, pela perspectiva protestante o vazio é suficientemente religioso: trata-se do mistério, do intangível, do sagrado intocável. Algo que o judaísmo e o islamismo também sabem muito bem como lidar e que foi bem desenvolvido pela chamada teologia negativa. Há uma reverência ao que não pode ser visto, materializado, racionalizado, elaborado, figurado: há uma presença naqueles espaços e não uma ausência. Acontece que mesmo o vazio precisa ser materializado pra não virar o nada. O vazio tem forma, o vazio marca presença. Esses altares pararam de me incomodar quando passei enxergá-los não enquanto altares vazios e sim como altares em homenagem ao vazio, ao insondável. Não pesquiso os holandeses e não consigo discernir as camadas estéticas, históricas, religiosas e arquitetônicas que os marcam, mas tenho a impressão de que os únicos interessados em preencher aqueles espaços são os pombos e os corvos.

    Adriano Godoy
    Adriano Godoy

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